
Querida,
Conte-me das coisas que não vi acontecerem. Fale das que eu esperava ansiosa.
Me fale também da vida amena. Da cor de suas cortinas novas.
– Você comprou mesmo, cortinas? - Sempre faz isso acompanhando grandes mudanças. “Novas penumbras para novas esperanças”, você dizia.
Estou desiludida e inquieta. Todos à minha volta estão satisfeitos com o trabalho. Eu não. Sonho com coisas estranhas sempre e sinto falta de companhia. Envelheço, minha amiga, não mentiria. As maçãs do rosto estão caindo; se me olho no espelho fico perplexa. O que mais me intriga é – elas acentuam mais ainda a queda quando sorrio. Depois disso venho me contendo – involuntariamente.
Esta cidade tem um vento violento. Ando muito a pé e tenho dificuldade. Estou mais magra.
O vento sempre me impede de apertar o passo e eu, sozinha, apesar disso, consigo ser mais assídua à esquina do que os ônibus que deixam velhinhas suando na parada. Vê se que elas definham debaixo do sol. A pele já flácida e rija parece derreter.
Não tenho tempo de pensar em minha tristeza. Gostaria, até. Minhas maiores reflexões vêm da rotina escassa. Reflexões seguidas de lamentações e sono. Mas a melancolia me persegue até em sonho.
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[em fotoartrografia]
Foto: Fabi Velôso
Atriz: Carola Oliveira
Tradução: Li